Para Marcia Cavalcanti
Prezada Márcia Cavalcanti,
Muita gente, como era de se esperar, morou na sua casa ou, para não assustá-la, morou no mesmo terreno onde, em meados do século XX, existiu sua casa.
No recuo do rempo, quase perdido no espaço, estas terras onde você nasceu, pertencia, em fins do século XVIII, a André Simões Lima. Este velho proprietário, parece ter presenciado a chegada da então Princesa Carlota Joaquina, que adquiriu as terras do lado direito do atual Largo do Machado, àquele que tinha do outro lado, os Marques Lisboa, como já comentei aqui, em outra nota. No entanto, pouco tempo depois, em 1810, já encontrava-se falecido e, seus herdeiros – rei morto, rei posto – logo se desfizeram da propriedade, ou kelhor, da grande chácara, que foi vendida, naquele ano de 1810, para Domingos de Souza Maia.
Souza Maia, assim, também foi um dos que andou peranbulando, nas noites escuras das Laranjeiras, quiçã amedrontando você, na sua primeira infância, ou seus pais.
Viveu algum tempo na casa de chácara que ali estava erguida, e teve por sucessora, sua viúva Maria Rosa da Assunção que, como de costume, logo no esfriar do corpo de seu amado defunto, foi logo vendendo parte da propriedade e, justamente adquiriu Ana Benedita de Lima, em 1828. As terras restantes, que corresponde hoje a rua das Laranjeiras, do número 228 ao 322, foram vendidas por seus filhos em 1855.
Ana Benedita, ali viveu até 1839, quando vendeu a propriedade, então com 20 braças de frente, para Antonio Dias Peixoto – mais um que andou muito pelos corredores de sua casa. Esta propriedade, em 1853, pertencia ao genro de Dias Peixoto, de nome Domingos José Gonçalves Machado e, neste época – o que hoje tem o número 280 – tinha o número 16. Domingos havia se casado em 1848, com Maria Dias Peixoto, a verdadeira herdeira deste quinhão de terras. Viveram muitos anos na chácara 16, da rua das Laranjeiras que, alguns anos antes de 1870, j[a em mãos de seus herdeiros, passou a ter um novo endereço, ou seja: Rua das Laranjeiras, número 54.
Agora, Márcia, a sua casa que tem o número 280, e que, na década de vinte do século XIX, recebeu o seu primeiro número – 16 (dezesseis) – em 1870, já era conhecida pelo número 54, tendo sido vendida pelos herdeiros de Domingos José Gonçalves Machado, para Luiz Antonio da Silva Guimarães, homem maduro, com quase 56 anos de idade, casado, e com seis filhos.
Seu antigo anfitrião, Luiz Antonio, era Fidalgo Cavaleiro da Ordem de Cristo de Portugal, Conselheiro da Caixa Econômica e Monte Socorro, criada pelo Decreto 2723, de 12 de janeiro 1861; Diretor do Novo Cassino Fluminense, que funcionava na Rua do Passeio, número 44; e era conssignatário de uma casa de comissões de generos de importação e exportação, que funionava na rua da candelária, 43.
Era casado com Leopoldina Pires da Silveira e, no ano de 1873, acomanhou a nova mudança da numerção das casas urbanas da Cidade do Rio de Janeiro, e a chácara 54, da rua das Laranjeiras,m antiga chácara 16, recebeu a nova numeração: 62.
O fidalgo Silva Guimarães, faleceu no Rio de Janeiro, a 17 de outubro de 1876, sendo sepultado no Cemitério de São Francisco de Paula, mais conhecido por Cemitério do Catumbi. A velha chácara ficou em mãos da viúva, Leopoldina Pires da Silveira, que faleceu quase vinte anos depois do marido, a 2 de setembro de 1894, sendo enterrada no mesmo campo santo, onde repousava seu marido.
Por ocasião do falecimento da viúva Leopoldina, a chácara tinha o número 84, e foi herdada por sua filha, Luiza Leopoldina Guimarães, VISCONDESSA DE ARAÚJO, nascida no Rio de Janeiro, em 1839. Ali viveu, no princípio do século XX, com seu marido, José Domingues de Araújo, português, capitalista no Rio de Janeiro, e agraciado com o título de Visconde de Araújo, pelo governo português, a 18 de Maio de 1868. O casal, parece ter se retirado para Macaé, onde tiveram seus filhos.
Márcia, você teria esbarrado com a Viscondessa, algum dia ?
Seja como for, saiu a nobreza do Império, e entrou a notabilidade da República e, já na casa número 280, da rua das Laranjeiras, outrora númeos 84, 62, 54 e 16, passou a residir, na década de vinte, do século XX, o renomado Dr. José Carlos Rodrigues (1844-1923), empresário, diretor do Jornal do Commercio, membro de destaque da elite republicana carioca. Foi quem patrocinou, no princípio do século, a construção do Hospital de Crianças da Santa Casa de Misericórdia, o primeiro do gênero no Brasil, num terreno no bairro de São Cristovão.
Entre 1941 e 1954, ali residiu Christovam Camargo, que atendia pelo tel. 25-6330. Finalmente, já em 1984, lá estava, o testemunho do progresso, versus a ação incontestável de destruição dos lugares de memória, malfadados ao esquecimento – a construção de um edifício de 16 andares, com quatro apartamentos por andar, e lojas no teérreo.
Att. Cau Barata
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